sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Tempo de ler , Aleilton Fonseca

Que livro o distinto leitor está lendo no momento? Ora, não se envergonhe se sua resposta for "nenhum". Você não está só no vale da desleitura atual. Uma revista educativa apurou que no Brasil poucos lêem. Quem tem tempo? Até para vestibulandos existem resumos comentados dos romances! Parece que o tempo de ler se perde nos congestionamentos, nas filas, nos serões dos escritórios. Cansado, o (ex)leitor acaba cedendo aos apelos da TV, do vídeo, do computador.

No mercado editorial, as tiragens diminuem e o número de títulos aumenta para disputar o universo exíguo de leitores. Mas há gente que tem mania de livro. Entra na livraria e não arreda pé dali enquanto não compromete o cartão de crédito com exemplares que mofarão na estante. Ontem li um livro que comprei em 1980. Outros mais amarelados me desafiam. Já encontrei uns velhíssimos no sebo, com páginas juntas, sem corte, um atestado cabal de virgindade.
Livros são caros e uma vez lidos se amontoam na estante, aparentemente sem serventia. Se não tivermos o espírito do descarte, tão necessário atualmente, corremos o risco de disputar espaço com eles. Os apartamentos não comportam livros, esses intrusos. Às vezes o quartinho de empregada serve. Fora isso, é espalhá-los pelos cantos, combinando cores e tamanhos. O meu vizinho os evita, pois sua mulher asseverou, com olhar grave: "ou nós ou eles". Em alguns casos, um três quartos acaba reversível para dois! Um vira "quarto de estudos" do insistente escritor ou professor de literatura. É certo que sempre aparece um amigo, um vizinho, um parente que nos toma algum livro emprestado e nunca mais devolve. A gente reclama, planeja cobrar o capital investido, mas ninguém tem coragem de buscá-lo de volta. Onde iria colocá-lo?
Um colega me disse que se lhe devolvessem os livros que já emprestou, abriria um sebo. Eis uma forma de se livrar deles, lidos ou não. Outro dia levei 30 à roda dos enjeitados. Consegui preços tão baixos que só pude adquirir na própria loja uns quatro ou cinco. Depois tive remorso: já comprei de volta uns dez, sempre com o preço triplicado. O que fazer? Não há tempo para ler tantos livros que escritores desocupados produzem sem parar. Por isso os amontoamos nessas pilhas enormes ao pé da cama, ao lado do som, na escada, sob a mesa, na esperança de que o mundo mude e o nosso velho tempo de leitura nos seja restituído. Ah, amigo leitor, meu semelhante, vamos começar uma cruzada pela leitura, antes que os autores desistam. Faça a sua boa ação de hoje: adote um livro.

Disponível em: http://kplus.cosmo.com.br/materia.asp?co=39&rv=Literatura acessado em: 01/01/2010


Um comentário:

martha disse...

Estou adotando livros de Milton HAtoum. Não o conhecia e estou apaixonada.